Pular para o conteúdo principal

Puma desenvolve modelo para avaliar ganhos e perdas - Soja com Floresta

Giovana Girardi, de O Estado de S.Paulo
Qual é o impacto de substituir uma vegetação nativa pela produção agrícola? A pergunta, geralmente respondida com uma lista de conhecidos benefícios que as florestas prestam para a sociedade e para a própria agricultura, acaba de ganhar uma explicação mais concreta: um valor.
O trabalho, coordenado pela ONG Conservação Internacional (CI-Brasil) e baseado no modelo do Teeb global, considerou diferentes práticas agrícolas na produção de soja e de óleo de palma (dendê) em estudos pilotos nas plantações das duas empresas.Não preservar o ambiente pode causar prejuízos reais ao produtor. É o que mostra o projeto Teeb (Economia dos Ecossistemas e Biodiversidade) para o Setor de Negócios Brasileiro, que estabeleceu uma valoração para os serviços ambientais - ou para o "capital natural", como eles chamam - em dois estudos de caso: um com a Monsanto e outro com a Natura.
Ao considerar nos cálculos o valor da biodiversidade e dos serviços que ela presta, como proteger o solo da erosão ou garantir a oferta de água, o valor da produção nos cenários em que houve adequação ao ambiente foi maior do que na situação tradicional de cultivo - o chamado "business as usual".
No caso da Natura, os pesquisadores compararam os dados de um hectare de monocultura de palmeira de dendê, de onde se extrai o óleo de palma, com os de um hectare de um sistema agroflorestal, que combina árvores nativas, como cacau e maracujá, com os dendezeiros. Ambos localizados no Pará.
No cenário agroflorestal, o valor ambiental total da produção - calculado pela diferença entre os ganhos prestados pelos serviços florestais e os impactos ao ambiente e à sociedade provocados pela cultura plantada - foi 200% maior que na versão "business as usual".
No estudo da Monsanto, realizado no oeste da Bahia, comparou-se um hectare de terra coberto só com a monocultura de soja com um outro em que a cultura convive com o Cerrado - bioma hoje mais ameaçado do Brasil e também por onde a soja mais se expande. Neste segundo cenário, baseado na proporção definida pelo Código Florestal - 80% de área cultivada e 20% de Reserva Legal -, o valor ambiental foi 11% maior que no cenário só com a monocultura.
Visibilidade. "A vantagem desse trabalho é trazer à tona um valor que até então era invisível, mas que é fundamental nas análises de risco da empresa. Está cada vez maior a expectativa de que se comece a cobrar pela poluição gerada por uma produção. Isso eventualmente pode ser colocado nos cálculos da compensação ambiental", afirma a bióloga Helena Pavese, coordenadora do projeto na CI.
"Mas não é só uma questão de impactos. As empresas utilizam o capital natural como base para seus negócios. Mudanças na oferta e qualidade deste capital afetam seu desempenho. Com esta abordagem de valoração, pudemos mostrar em cifras, e não tanto quantitativamente, como a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos são importantes para a empresa."
Uma das expectativas do trabalho é que os resultados possam eventualmente ser incorporados nos processos decisórios das empresas. É o que planeja a gerente de responsabilidade social, corporativa e de sustentabilidade da Monsanto, Daniela Mariouzzo, que coordenou o trabalho na empresa.
"Não é de hoje que se discute como produzir mais alimentos, preservar a natureza e que isso seja viável economicamente no longo prazo. Como beneficiar todos os envolvidos nisso? A resposta passa por trazer algo concreto para a mesa. Acho que esse estudo é um começo para o debate. Mas ainda não é algo completamente consolidado", diz.
"Os números traduzem o que já se conhece na prática: produzir soja sem o Cerrado afeta o clima, a polinização, a conservação da água. E trazem mais argumentos para debater com todos os atores." Ela afirma que o próximo passo é trabalhar mais o estudo dentro da empresa, principalmente com outros setores, como o de avaliação de riscos, e com os produtores rurais.
Mais a longo prazo, a ideia é usar esse tipo de informação para desenvolver um mecanismo que remunere os produtores que preservem o Cerrado. Por lei, eles já são obrigados a isso, e quem não cumpre tem de se regularizar. "Mas podemos pensar numa forma de pagar quem quiser proteger além do que manda a legislação", defende.
Cadeia. Na Natura, o estudo se inseriu em um processo mais amplo - iniciado em 2010 e já incorporado na decisão dos negócios -, que prevê avaliar toda a cadeia de suprimentos, da extração da matéria-prima à entrega do produto ao consumidor. Em relação ao óleo de palma, matéria-prima para a produção de sabonetes, a empresa vinha buscando a alternativa do sistema agroflorestal há cinco anos em parceria com a Embrapa.
"Já sabíamos que havia uma viabilidade técnica, em escala pequena, mas não sabíamos o valor disso. Só do ponto de vista econômico, a monocultura parece mais eficiente, uma vez que tem produtividade alta por causa da mecanização. Mas o estudo mostrou outros valores ambientais e sociais que o modelo tradicional não olha", diz Luciana Vila Nova, gerente de sustentabilidade da Natura. No futuro, diz ela, a ideia é conseguir mostrar o valor ambiental de cada produto da empresa.
ENTENDA COMO FOI FEITO O CÁLCULO
Para fazer o cálculo do valor ambiental da produção de soja e de óleo de palma, os pesquisadores compilaram uma série de estudos já disponíveis na literatura científica que, individualmente, já haviam aplicado um valor monetário às quantidades físicas de capital natural.
O número estimado para um hectare de cada cenário foi obtido com a soma dos serviços ecossistêmicos subtraídos da soma dos impactos. Contam como serviços a capacidade de provimento (de alimento, água doce, madeira, combustível, fibras e outros recursos) e de regulação (do clima, da água e o controle da erosão) daquele ambiente. Como impactos agrícolas diretos são considerados poluição do ar e da água e emissões de gases de efeito estufa.
Também foram levados em conta valores de mercado, quando eles já existem, como é o caso da madeira e de créditos de carbono. Por exemplo: o preço do carbono, segundo o relatório Stern do governo britânico, taxado em R$ 233 por tonelada de dióxido de carbono (CO2) equivalente, foi usado para valorar as emissões de gases de efeito estufa.
No estudo da Natura, o valor ambiental total obtido com os sistemas agroflorestais com óleo de palma é três vezes maior do que aquele obtido com a monocultura do óleo de palma – R$ 410.853 por hectare, contra R$ 122.253 por hectare, durante a vida útil de 25 anos da plantação. Esse resultado foi obtido principalmente porque os impactos da monocultura são quatro vezes o impacto dos sistemas agroflorestais.
Na Monsanto, o valor da produção de soja aliada à conservação do Cerrado é 11% maior que a monocultura de soja – respectivamente R$ 1.139 por hectare ao ano, contra R$ 1.031.
O modelo adotado no estudo foi baseado no Teeb global, lançado em 2010 pelo economista indiano Pavan Sukhdev em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Ambiente. O estudo estimou que o custo anual da perda da biodiversidade fica entre US$ 2 trilhões e US$ 4,5 trilhões.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Agroecología Bases teóricas para el diseño y manejo de agroecosistemas sustentables Editores: Sarandón, Santiago Javier | Flores, Claudia Cecilia

Agroecología Bases teóricas para el diseño y manejo de agroecosistemas sustentables Editores:  Sarandón, Santiago Javier |  Flores, Claudia Cecilia 2014 Tipo de documento:   Libro Resumo El libro Agroecología y Desarrollo Sustentable, editado por Santiago J. Sarandon y Claudia Cecilia Flores de La Facultad de Ciencias Agrarias y Forestales de la UNLP, viene a llenar un gran vacío en nuestra literatura agroecológica al entregarnos un libro adaptado a las necesidades del currículo agronómico que se desarrolla en la mayoría de las Universidades e Instituciones de Educación Agropecuaria en América Latina. El libro se suma a la escuela de pensamiento que define a la Agroecología como la aplicación de conceptos y principios ecológicos en el diseño y gestión de agroecosistemas sostenibles. La Agroecología aprovecha los procesos naturales de las interacciones que se producen en la finca con el fin de reducir el uso de insumos externos y mejorar la eficiencia biol...

Presença de Glifosato em Leite Materno

Testes realizados em mães estadunidenses mostraram a presença do herbicida glifosato, comercializado pela Monsanto sob a marca  Roundup , no leite materno. Os testes foram encomendados pelas ONGs  Moms Across America  e  Sustainable Pulse  e mostraram altos níveis do veneno em 3 das 10 amostras coletadas (76 ug/l, 99 ug/l and 166 ug/l): de 760 a 1.600 vezes maiores que o limite máximo permitido para a água potável na Europa. Foram também analisadas amostras de urina e de água potável nos EUA para detecção de glifosato. Os níveis do herbicida encontrados nas amostras de urina foram mais de 10 vezes maiores que aqueles encontrados em testes similares realizados na Europa em 2013 pela ONG Friends of the Earth . A presença do glifosato também foi detectada em 13 das 21 amostras de água potável, algumas em níveis superiores ao limite permitido na Europa. Zen Honeycutt, fundadora e diretora da ONG  Moms Across America , informou que “as mães q...

Agrotóxicos, conhecimento científico e popular

Continuando as informações sobre agrotóxico e saúde humana, excelentes estudos disponibilizado pelo Ecodebate. ‘Agrotóxicos, conhecimento científico e popular: construindo a ecologia de saberes’ já está disponível na internet Publicado em janeiro 18, 2013 por  HC Terceira parte do dossiê Abrasco já está disponível na internet ‘Agrotóxicos, conhecimento científico e popular: construindo a ecologia de saberes’ é o título da última parte do documento, lançado durante o Abrascão Dossiê Parte 1 – Agrotóxicos, segurança alimentar e nutricional e saúde Dossiê Parte 2 – Agrotóxicos, saúde, ambiente e sustentabilidade Dossiê Parte 3 – Agrotóxicos, conhecimento científico e popular: construindo a ecologia de saberes Nos últimos três anos o Brasil vem ocupando o lugar de maior consumidor de agrotóxicos no mundo. Os impactos à saúde pública são amplos porque atingem vastos territórios e envolvem diferentes grupos populacionais como trabalhadores em di...